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Sofia Rolim

‎“A academia do futuro será horizontal e cooperativa”: entrevista com o professor ‎Thiago Amparo


Minibio: Doutor (2018) e mestre (2011) em Direitos Humanos pela pela Central European University (Hungria) e graduado pela PUC-SP (2008). Atualmente, é professor da FGV Direito SP e da FGV RI, coordenador do Núcleo de Justiça Racial e Direito da FGV Direito SP e colunista da Folha de São Paulo.


Entrevistadoras: Carolina Bianchini Bonini e Sofia Rolim (mestrandas na FGV Direito SP).




Como foi a sua aproximação com a pesquisa, e com a carreira acadêmica, na graduação em Direito? Como foi essa aproximação com a pesquisa, e a decisão por fazer um mestrado e um doutorado acadêmico?

"Eu nunca achei que eu seria acadêmico, na verdade, não sei se essa é a primeira resposta que vocês gostariam de escutar. Acho que, primeiro, eu tinha um pouco de receio sobre a academia, achando que ela me colocaria numa torre de marfim. Isso vem de uma perspectiva que é: eu trabalhava, antes, no terceiro setor. Eu trabalhei na Conectas Direitos Humanos durante vários anos. Foi, na verdade, o meu primeiro trabalho. Na verdade, o meu primeiro trabalho na vida foi ser estagiário da professora Eloísa Machado da FGV, quando ela liderava o programa sobre violência institucional na Conectas, trabalhando com combate a tortura e maus-tratos contra adolescentes na antiga FEBEM. Então, meu primeiro trabalho na vida foi esse. Eu gostava muito daquela coisa de você estar realmente com a mão na massa, fazendo um trabalho com muito impacto direto, apesar de todas as dificuldades estruturais de mudar as coisas. Então, a academia para mim soava como algo distante, mas eu acho que eu comecei a mudar de ideia quando passei a olhar a universidade com uma possibilidade de intervenção no debate público, e também uma possibilidade de entender – especialmente por meio da pesquisa aplicada – a realidade em que estamos inseridos. Eu via que o que eu, às vezes, fazia no relatório da Conectas não era tão diferente do que eu poderia fazer em uma pesquisa aplicada, então acho que o que mudou a minha ideia foi isso. Eu também sempre gostei da escrita, sempre gostei de estudar, mas especialmente da escrita, então eu estava procurando uma profissão que fizesse com que eu escrevesse e aí eu achava mais interessante e forte que eu escrevesse de um ponto de vista acadêmico, que eu sentia que era uma escrita mais autoral, do que escrever uma petição para um juiz que tem toda uma dinâmica diferente. Então, acho que a minha aproximação com a academia foi isso, perceber que não era uma torre de marfim, que eu poderia fazer com que fosse mais próximo de pesquisa aplicada, de um debate público, e também a paixão pela parte da escrita e por uma escrita mais autoral – o que, inclusive, depois me aproximou mais do jornalismo e outras áreas, mas a escrita acadêmica me possibilitou um pouco de uma avenida pela qual eu também poderia trabalhar com uma escrita autoral e isso me atraiu."


Também queríamos saber como foi essa decisão de estudar no exterior para o mestrado e o doutorado na Universidade Centro-Europeia (Central European University). Como foi esse processo?

"Então, tem a parte que a gente escreve no LinkedIn, que é que foi uma experiência ótima, multicultural, adorei morar fora e tudo isso, e tem a parte prática, quer dizer, eu não tinha contatos na USP. O processo de avaliação na USP é muito fechado e dá muito poder para os orientadores na seleção, e eu também não tinha recursos financeiros para poder custear o mestrado. Então, para mim, no Brasil, havia uma impossibilidade, seja pela pouca possibilidade de bolsa, ou as bolsas que existiam eram muito pífias e acho que não davam conta. A universidade fora me possibilitou uma bolsa integral e também achei que me possibilitou uma avaliação mais baseada no que eu tinha feito, no meu mérito, etc., do que o que eu via no Brasil, então isso foi um fator importante. Outro fator importante, para o doutorado, foi que, no Brasil, você tem, em geral nas universidades, a exigência de uma outra língua além do inglês. E o inglês eu aprendi de uma forma muito autodidata mesmo, lendo livro com o dicionário do lado, assistindo Friends e assistindo filme com legenda, etc. Então, eu pensei: "eu não tenho tempo, embora eu adore línguas, para ter um outro processo de aprender francês ou alemão, seja lá o que for", o que é algo muito peculiar da cultura acadêmica brasileira. Então havia esses fatores de dificuldade de acesso e de permanência na universidade. Para mim, era impossível estar no Brasil recebendo uma bolsa muito pequena durante quatro, cinco anos do doutorado, enquanto que lá em Budapeste eu tinha uma bolsa muito boa, que inclusive permitiu que eu fizesse sanduíche em outros lugares, que eu fosse para a Universidade de Columbia e outros lugares. O pós-doc que eu estou fazendo agora – coincidentemente agora eu estou em São Paulo, visitando a família, mas eu “estou” em Nova York – é também com bolsa. Então assim, não tem outras possibilidades, senão essa. Acho que tem um aspecto do caráter multicultural de encontrar pessoas diversas e ter uma educação internacional é interessante intelectualmente, mas tem também uma coisa muito prática de que acho que a gente ainda está muito longe de ter uma democratização do ensino na inserção na pós-graduação no Brasil."

Nós sabemos que a academia é ainda um meio muito elitizado e também muito masculino, muito branco e muito heteronormativo. O que o senhor diria para jovens pesquisadores que não estão dentro desse padrão esperado e que enfrentam vários desafios por causa disso?

"Uma vez eu escrevi um texto chamado "Cercas Farpadas Entre o Mundo e Eu", que está na Gama Revista, refletindo um pouco sobre as dificuldades que nós temos dentro da universidade e da academia, seja pensando um pouco sobre os corpos negros, mulheres, pessoas LGBTs, com deficiência e vários outros que muitas vezes são enquadrados em caixinhas. Eu acho que há vários desafios e formas de tentar superar esses desafios.

Primeiro, eu acho que, na universidade, em geral, os homens brancos são vistos como sujeitos universais. Eles não precisam datar seus gêneros, não precisam datar a sua classe social, não precisam datar a sua raça e eles falam de forma universal sobre os problemas do mundo. Isso não é de hoje, a academia é assim. Eu estava lendo um livro que falava sobre raça e Iluminismo, e como que grandes filósofos falavam sobre raça, e podemos olhar também como grandes filósofos falavam sobre mulheres, por exemplo. Então, quando se falava “todos são livres e iguais”, no “todos” tem uma nota de rodapé ali, que é são só aqueles que são livres, os não escravos, os que são brancos, os que não são estrangeiros e os que não são mulheres. Então, a academia tem esse aspecto do sujeito universal. Uma forma de combater isso, é a gente tentar sempre mostrar que o que está se produzindo ali, seja qual área for, por mulheres, por pessoas negras, etc., é ciência sim, e, ao mesmo tempo, usar as experiências, não só experiências, mas as visões de mundo que muitas vezes são diferentes. Aqui eu não estou falando de “lugar de fala”, porque eu acho que lugar de fala tem toda uma complexidade e acho que não faz muito sentido também, mas a gente não precisa entrar nessa discussão. Estou falando de uma perspectiva de que o conhecimento também é socialmente informado e também é informado a partir das experiências e das visões do mundo que nós temos. Então, eu acho importante a gente sempre afirmar o caráter científico do que fazemos.

Segundo, acho que a gente precisa ter noção que as barreiras na universidade existem não só porque as pessoas têm o poder de impor essas barreiras, mas também porque as pessoas têm medo de que a gente derrube essas barreiras. Porque eu acho que quando você tem, por exemplo, uma diversificação do corpo docente, alguém vai falar: "não, espera aí, você simplesmente ignorou uma literatura inteira que você nunca olhou que existe aqui na minha área. Como você pode escrever sobre desenvolvimento sem engajar a literatura feminista?” E não é uma coisa de “Ah, eu tenho uma bandeira ativista dentro da universidade”, é que seu trabalho acadêmico é ruim porque não leva em consideração toda essa literatura que outras pessoas estão estudando. E aí que não necessariamente, óbvio, que só mulheres podem estudar literatura feminista, mas é que se tiver essa diversidade, você provavelmente tem mais chances de ter um olhar diverso sobre essas diferentes questões que a academia precisa enfrentar. Então, eu acho que isso é importante.

Terceiro, acho que a academia, muitas vezes, é muito hierarquizada e individualista. Até teve um meme engraçado que eu vi esses dias que falava da diferença entre a academia (universidade) e a academia (de exercício). Ele falava “nossa fui num lugar com pessoas cheias de vaidade, que só pensavam em si, só se olhavam no espelho – e depois eu fui na outra academia, que é a academia de exercício”. Quer dizer, a academia é muito autocentrada, mas a gente vai ver que grandes avanços nas ciências em várias áreas não são feitos sozinhos, não se trata de uma mente brilhante que sempre pensa sobre questões do mundo. Na universidade, cada vez mais, há uma tendência dos trabalhos sérios serem trabalhos colaborativos. Quando o [Thomas] Piketty escreve um livro, ele não está escrevendo sozinho. Por trás de todos aqueles dados, tem uma equipe inteira de um centro de pesquisa fornecendo aquelas informações, ele não vai acordar sabendo sobre o Brasil de uma hora pra outra. Quando a gente vai ver especialmente escritos nas áreas de medicina, por exemplo, tem papers assinados por dez pessoas, porque aquele conhecimento exige uma complexidade. Eu acho que, ao diversificar também o corpo docente e discente das pós-graduações, em geral e no Direito em específico, você tende a trazer pessoas que estão acostumadas a criar teias de solidariedade e de cooperação, porque isso é uma técnica de sobrevivência. Não só entre si – como fazer, sei lá, uma solidariedade com outros professores negros, porque também é difícil você encontrar outros –, mas você ter solidariedade com pessoas que também são aliadas, que realmente veem você como uma pessoa séria, veem você como uma pessoa que está fazendo ciência, que está trazendo outra perspectiva sobre aquele determinado tema, criar redes de colaboração. Então, acho que não é fácil, mas a academia do futuro efetivamente vai ser mais horizontal e mais cooperativa, porque os problemas são muito complexos, não dá para resolvermos um problema a partir de um único olhar, ele depende de vários olhares, e acho que as pessoas que, em geral, sofreram muitas barreiras pra poder chegar nesses lugares estão mais habilitadas, muitas vezes, porque elas têm técnicas de sobrevivência como a colaboração, a solidariedade e a horizontalidade. Acho que essas pessoas estão mais capacitadas para a academia do futuro do que as pessoas que acham que a academia é “a minha pesquisa, o meu umbigo, a minha visão de mundo”. Então, acho que isso é fundamental.

E, por último, acho que para as pessoas que estão entrando ali, você não precisa ter medo de também colocar as suas posições de mundo e engajar criticamente sobre determinado tema, porque uma das formas de domesticar pessoas que são consideradas “diversas” – e eu não gosto desse termo porque ele supõe que existe uma norma, né? –, é colocá-las numa caixinha. Então você diz o seguinte: “olha, tudo bem, você pode até estar aqui na universidade, mas você só fala sobre esse tema.” E aí eu acho que é um desafio, mas um desafio que passa por reverter essa lógica, que fala "não, pera aí", os temas que são considerados universais são dominados, em geral, por homens, brancos, ricos, etc., que estudaram nos mesmos colégios e nas mesmas faculdades, eles são incompletos para olhar as diferentes dinâmicas, se você não olhar de uma lente plural, e acho que isso é fundamental. Então, é um pouco sobre “hackear” áreas que são consideradas como ciências duras, e acho que é importante a gente ter o domínio de metodologia, o domínio de ciência de dados agora, e outras áreas que são importantes e que vão servir de ferramenta para conseguir mudar diferentes campos no mundo.

Então, acho que esses são os desafios e dicas que a gente precisa ter em mente para conseguir viver nesses ambientes que, muitas vezes, são hostis."


Como foi a escolha do seu tema de pesquisa de mestrado e de doutorado? Ela teve relação com tentar fazer da academia um espaço diferente?

"A minha orientadora em Budapeste brincava comigo falando que minha tese era uma forma de terapia. Porque começou com uma discussão sobre descriminação: a dissertação era sobre descriminação LGBT, mas a partir da perspectiva de ter uma teoria filosófica sobre nojo. Então, olhava muito para a [Martha] Nussbaum e outros filósofos que questionavam essa ideia da racionalidade, e analisava a discussão sobre a ofensa e as violações dos direitos LGBT a partir desse olhar, que seria do irracional e do que é o irracional, etc. E minha pesquisa de doutorado foi uma intersecção da questão racial da questão LGBT, o que tinha tudo a ver comigo, sendo um homem gay, etc. Mas eu tinha o interesse em, apesar dessa piada sobre terapia, eu queria fazer, na verdade, o oposto. Eu queria trazer o olhar que eu tinha sobre esses temas, mas não fazer aquilo ser sobre mim. Escrever a tese dizendo que no debate jurídico sobre Constituição, no doutorado, ou no debate jurídico sobre Direito Internacional e sobre Direito Internacional dos Direitos Humanos, no mestrado, existe uma lacuna séria que ignora justamente a intersecção entre pessoas LGBTs e pessoas negras. E também existe uma lacuna no Direito em geral, no Brasil, para uma discussão que, agora, está sendo mais preenchida por pessoas como Adilson Moreira, na questão de descriminação. Que descriminação é uma área do Direito, tanto quanto Direito Civil, Direito Constitucional, etc. Então, começou sim como quase um insight a partir de uma experiência pessoal, mas ele foi como uma tentativa de inserir no debate jurídico algo que estava apagado e que precisava ser melhor trabalhado. Então, vem de uma constatação pessoal, mas depois foi muito fruto de uma constatação do campo de pesquisa, de que tinha uma lacuna sobre esses temas: descriminação, questão racial e LGBT. E acho que isso foi fundamental para eu conseguir ter confiança de que aquilo era um tema sério, e que não era só porque eu estava escrevendo aquilo, mas algo que tinha sentido de forma mais objetiva."


Pensando que o senhor estudou esse tempo todo na Universidade Centro-Europeia (Central European University), a qual foi muito afetada, recentemente, pelas medidas autoritárias de Viktor Orbán, e hoje, no Brasil, nós vivemos também um processo de deterioração democrática que tem sido estudado na FGV pelo projeto Estado de Direito e Legalismo Autocrático (PAL Project) no qual o senhor é um colaborador. Então gostaríamos de perguntar quais são as lições que talvez tenhamos a aprender com a experiência Húngara?

"Isso é bem interessante. Inclusive, a minha orientadora Renata Úitz, que é uma das principais vozes sobre Direito Constitucional na Hungria, diz que a gente não pode dar de barato, não pode take for granted, que a liberdade acadêmica sempre vai existir. Ela é muito frágil porque ela depende de vários fatores. Ela depende de uma indução de investimentos, então você precisa de uma certa proteção contra interferências, inclusive financeiras. Na Hungria, por exemplo, eles criaram uma academia de ciências alternativas basicamente financiada pelo Orbán, e isso atrai os professores que estão ganhando salários ruins nas outras universidades, eles acabam trabalhando lá, mesmo que não concordem com a orientação. Então existe uma força que não é de controle de conteúdo, mas é um controle institucional. Ou o reconhecimento de cursos, como aconteceu na Hungria, de você cortar o reconhecimento de alguns cursos específicos, por exemplo, sobre gênero, porque se entendia que aquilo não era sério, ou algo parecido. Então de que forma você pode ter uma política institucional para poder selecionar as áreas prioritárias e quais são as áreas não prioritárias. A questão de corte de gastos, como mencionei, para as universidades, como estamos vendo no Brasil também, direciona muito claramente as pesquisas, e direciona quem quer ser acadêmico, quem não quer, e quem pode ser. Então, acho que a experiência da Hungria mostra que a liberdade acadêmica não é algo tão sólido quanto a gente acha que é, e pode ser, muitas vezes, profundamente atacada, e não necessariamente só a partir de um instrumento controle de conteúdo. Às vezes, a gente espera que vai vir uma portaria dizendo “a partir de amanhã não pode mais discutir sobre Direito e Desenvolvimento”, isso não vai acontecer. O que pode acontecer é a diminuição dos recursos para pesquisa, atrasos burocráticos, muitas vezes pode acontecer de ter visitas de autoridade de educação, ou direcionamento ideológico para impulsionar alguns tipos de conteúdos em detrimento de outros. Então, acho que tem várias formas de você promover um ataque à liberdade acadêmica que não seja por meio de controle de conteúdo diretamente, mesmo que a gente veja no Brasil, hoje, controles de conteúdo mais claros, basta ver o caso do Conrado Hübner. Aqui tem duas questões: não só a intimidação judicial contra o Conrado pelas suas críticas como intelectual público, mas também o silêncio da USP durante bastante tempo. Demorou para a USP efetivamente arquivar o processo disciplinar contra ele, ali sugerido pelo Procurador Geral da República. Era para ter acontecido no dia seguinte, dizendo que os professores têm liberdade acadêmica e que o debate público faz parte da liberdade acadêmica deles. Então, acho que as relações de poder e os ataques institucionais que muitas vezes não são diretamente por controle de conteúdo, são questões que são similares ao contexto aqui do Brasil. O que é diferente é que a gente tem uma solidez, eu acho, maior, em termos de universidades, especialmente universidades públicas. O problema é até quando essa solidez pode perdurar, especialmente quando se tem, nas universidades federais, tentativas de controle de cooptação de eleição de reitores, por exemplo. Então, como a gente consegue segurar esse tipo de interferência e independência das universidades, com universidades perdendo recursos e tendo interferências políticas na escolha de seus dirigentes. Isso a gente tem que ver a médio prazo, mas eu acho que tem mais universidades fortes do que tinha e têm na Hungria, apesar de lá ter algumas universidades fortes também, então acho que aqui é mais difícil e mais amplo, mas não é impossível, esses ataques já tem acontecido em diferentes frentes."


O senhor tem alguma dica cultural para jovens pesquisadores? Pode ser de música, livro, filme...

"Boa! Tem um podcast que chama Cientistas na Linha de Frente que acho bem legal porque ele fala muito sobre a questão da pandemia e sobre cientistas na época da pandemia. Eu acho isso legal porque mostra os desafios da ciência na época da pandemia, e também mostra a relevância da ciência – porque se não tivesse ciência, a gente não saberia dados, não teria vacina… E não só da ciência médica, mas do Direito também: pensar um pouco sobre quais formas de omissão com relação a pandemia existiram, ou de ação mesmo contra medidas de combate à pandemia. Então acho que isso dá um ânimo de que a gente não tá em uma torre de marfim, temos uma influência relevante na sociedade.

Outro podcast que eu gosto bastante é o Vidas Negras, que conta a história de várias personalidades negras no Brasil. Eu acho legal que também mostra que o conhecimento não é só aquele que é produzido dentro da universidade. E também mostra muitos conhecimentos que são produzidos fora da universidade e que não são reconhecidos pelos parâmetros da universidade, os parâmetros excludentes, muitas vezes, da universidade, como não é um conhecimento que fosse digno, mas que são, na verdade, aqueles que vão mudar o mundo. Eu fico pensando, o que que é mais relevante: a gente ter um artigo acadêmico que não inova em nada, e que fica simplesmente em um "blá blá blá", e se referenciando um ao outros – porque isso é bem comum na academia, citando uns aos outros –, ou você ter um texto completamente revolucionário, como da Lélia Gonzalez em que ela analisa a etimologia da palavra “bunda”, e esse texto vai ficar pra sempre, as pessoas vão ler e reler e entender como ela conecta isso com psicanálise e com Freud, só que não nos termos que a ABNT gostaria que fosse, ou qualquer coisa parecida. Obviamente, isso não é desmerecer o conhecimento técnico dentro da universidade, mas é entender que existem outras formas de conhecimento que também são válidas, e, às vezes, até mais revolucionárias, que avançam o conhecimento. Então, acho que é importante a gente ter essa visão de que quando a gente trabalha com pessoas reais, eles não são objetos da nossa pesquisa, eles são sujeitos de ação. A gente que é observador é que está tentando entender a realidade deles, não o contrário, eles não são nosso objeto dentro do nosso laboratório. Eu acho que entender isso é entender que o conhecimento é muito mais horizontal do que a hierarquia da universidade tenta impor."

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